sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

A saga de Jorge

Jorge era estudante de jornalismo. Aliás, um dos muitos estudantes que não desistiu do sonho de trabalhar em regime de semi-escravidão por um salário miserável mesmo após a queda do diploma. Ele também se ofendeu quando nosso querido ministro comparou jornalistas a cozinheiros e babás (meu profundo respeito por essas profissões). E se indignou quando o Arruda fingiu não estar nem aí, sob as vaias da imprensa.

Como todo estudante de jornalismo, ou pelo menos como a maioria, Jorge estava sempre duro. Mesmo antes de encarnar na profissão, já sentia os reflexos da falta de dinheiro. A namorada o largou porque não queria um cara que não podia nem levá-la ao cinema. Foi então que resolveu mudar sua vida. Não, ele não desistiu do jornalismo, nem daqueles ideais solitários que invadem a mente de todo universitário, aquela certeza de que pode mudar o mundo, acabar com a corrupção, socorrer os feridos do Haiti, essas coisas de sempre.

Jorge resolveu procurar um estágio!

Mas como sabemos, entrar no mercado de trabalho, principalmente no mundo do jornalismo (mundo este em que centenas de pessoas disputam uma vaga de salário mínimo como se fosse um bilhete premiado da loteria), não é algo tão simples. São necessários, no mínimo, 3 requisitos. 1 - Se quiser trabalhar em TV (e esse era o sonho de Jorge), tem que ser bonito. E esse, certamente, não era o caso de nosso amigo. Jorge não era bonito e sabia disso, mas ele tinha uma boa locução a seu favor. 2 - Se quiser trabalhar em impresso, tem que ser um leitor assíduo. Outro ponto negativo desse jovem estudante, preguiçoso e sonhador. Ele passava horas de seu dia em frente ao computador, ocupadíssimo com vídeos de humor, resumos de novelas e, acreditem ou não, chats com atrizes pornô. Aliás, a pornografia foi algo que sempre o fascinou. Tanto que alguns de seus trabalhos da universidade eram críticas de filmes pornô. E críticas bem feitas por sinal. Mas ainda assim, isso não representava um grande diferencial para um estudante sem experiência no currículo à procura de uma oportunidade. 3 - Por fim, tem que ter um padrinho, alguém influente ou mesmo um conhecido qualquer que lhe indique e lhe ajude. Mas Jorge era um jovem sem muitos contatos profissionais. Seus conhecimentos e relacionamentos com pessoas mais velhas ou que já estivessem no mercado não passavam de seus colegas e professores.

Dessa forma, as chances de conseguir um emprego, ou melhor, um estágio na área eram reduzidíssimas. Mas para quem tem motivação de continuar em um curso de jornalismo mesmo sabendo que pagam mal, que o diploma não tem mais valor, que faz-se hora extra todo dia e que nunca se recebe por isso, que corre o risco diário de ser furado, de perder a matéria dos sonhos, que nunca vai progredir se não for uma funcionária gostosa ou um bajulador do chefe, que todo jabá que receber será mal visto, que sua vida amorosa e principalmente, sexual, será um desgraça, não porque será rejeitado, mas porque, enquanto trabalha, sua mulher vai ficar com o Ricardão, recebendo todo o afeto (ou seja lá o nome que queiram dar) que o pobre jornalista não tem tempo de conceder, se mesmo assim ele tem coragem de continuar cursando jornalismo, conseguir emprego não passa de mais uma pequena barreira a ser ultrapassada. 

Sendo assim, o corajoso Jorge segue na procura de um estágio, larga currículos (com a fonte em tamanho grande, espaçamento duplo, todas as artimanhas para tentar preencher uma folha A4, algo dificílimo para quem nunca trabalhou nem fez cursos complementares), se inscreve em agências, anota as oportunidades dos classificados. Mas o tempo vai passando. Uma semana desde a difícil decisão, uma decisão sem volta pois começar a trabalhar no jornalismo é algo que vicia. Por piores que sejam os dias de trabalho, é estimulante estar ali. Mas Jorge ainda não sabe o que é isso, porque ninguém quer lhe dar uma chance. Talvez se mandasse em anexo ao currículo uma de suas críticas, pensava. Mas não saía do lugar. Ficava apenas pensando o que poderia fazer para melhorar seu currículo, melhorar suas chances de afundar-se para sempre nesse mar desgastante e compensador (não financeiramente é claro!). Até que seu telefone toca. Do outro lado, uma agência, uma vaga, finalmente uma oportunidade!

Mas será que Jorge vai conseguir seu tão sonhado estágio? Descubra segunda-feira, no próximo post.

2 comentários:

  1. Muito bom! Segunda, estarei na mesma hora e no mesmo canal.

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  2. Gostei do "seu jeito" de escrever sobre a história de Jorge. Se permitir, postarei em meu blog o final de sua saga.

    Abraço eco-nascentes!

    Helena Bernardes
    http://hqavidaconta.blogspot.com/
    http://riopiracanjuba.blogspot.com/

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