quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Dez livros para salvar do Apocalipse

Conforme prometido, uma vez ao mês falarei sobre um dos livros indicados pelo professor Paulo Pinheiro como "os 10 livros para salvar do apocalipse". A primeira obra é "1984", de George Orwell.

AVISO DE SPOILER

    Se 1984 tivesse sido escrito no ano que dá nome à obra, é possível que seu conteúdo não fosse tão atual em muitos de seus aspectos. O livro, escrito em 1948 (84 invertido), deveria ser a leitura de cabeceira de todos os profissionais da comunicação. George Orwell relata, durante 277 páginas (7ª Edição, 1973 – Companhia Editora Nacional), uma sociedade fictícia em que não há liberdade de expressão ou pensamento, em que a língua é reduzida a cada ano para que não existam meios de argumentar contra o governo e sua ideologia. Um mundo em que a verdade é modificada a cada instante e onde uma mentira, dita muitas vezes, realmente é aceita como verdadeira.

    A história se passa na Oceania – um supercontinente que compreende as Américas, as ilhas do Atlântico, a Australásia e parte da África – e relata a vida e os pensamentos de Winston Smith, um funcionário do “Ministério da Verdade”, um dos quatro ministérios que controlam o “império”. Winston, ao contrário da maioria dos “membros do partido” - a classe média da sociedade na Oceania – não se conforma com muito do que vê diariamente. Sua função no ministério é alterar documentos que possam conter informações que não convêm ao governo. Assim, Winston  reescreve exemplares de jornais, artigos, livros e documentos oficiais diariamente. Mas ele guarda recordações de um passado distante, de um mundo esquecido por todos e é movido pela dúvida: será que o mundo de antes da revolução era pior do que o atual?

    Ser membro do partido significa viver em igualdade de bens materiais com os outros membros. Assim, o governo do Grande Irmão – um homem louvado pelos partidários como um Semideus – distribui uma quantidade limitada de recursos de forma uniforme aos que trabalham nos ministérios, enquanto os proles, a classe subalterna que não desfruta dos “benefícios” oferecidos pelo governo, vivem às margens da sociedade, sem regramento que os comande ou Estado que os proteja. Mas esse “controle totalitário” da sociedade por parte dos membros do Partido Interno – uma classe mais abastada do partido e diretamente ligada ao Grande Irmão – não seria possível sem o desenvolvimento dos meios de comunicação.

    O desenvolvimento dos televisores (ou teletelas) proporcionou aquilo que faltava para que uma classe obtivesse poder total sobre o povo: a vigilância constante. As teletelas tornaram possível o controle total do pensamento através do medo e da alienação. A “Polícia do Pensamento” procura por “ideocriminosos” - aqueles que têm uma ideologia contrária à do partido – e os executam. E o televisor (que na história de Orwell é um instrumento que além de exibir também capta som e imagem) é a principal forma de controle. Além disso, desde cedo as crianças são educadas para tornarem-se membros irrevogáveis do partido, sendo incentivados a denunciar “suspeitos” por “crimideia” (palavra em novilingua referente aos criminosos do pensamento).

    E falando em “novilingua”, esse é o nome dado ao novo idioma oficial do continente. A língua passa a ser desconstruída. Milhares de palavras são destruídas e outras são criadas, ano após ano. Conceitos  que possam inspirar grandes ideias simplesmente desaparecem dos dicionários e caem no esquecimento. O novo idioma (ainda em processo de implantação) vem fundado no princípio de que, em breve, mesmo que se tenha ideias contrárias às do governo, será impossível defendê-las, simplesmente por não existir uma palavra que sustente seu argumento. E é nesse contexto que a história de Winston é desenvolvida.

    Todas as dúvidas e os pensamentos que dão sustentação ao enredo se desenvolvem a partir do momento em que Winston se sente motivado a quebrar algumas “regras sociais”. Além de pensar em coisas que não deviam ser pensadas e questionar-se sobre a real eficiência do estado, o personagem compra uma caneta e papel (algo terminantemente proibido pela polícia do pensamento) e começa a escrever, pela simples necessidade de se expressar. Ele relembra fatos já adormecidos em sua memória e conhece uma moça com quem passa a ter um caso (outro ato ilegal perante o estado). Winston e Júlia (nome da moça com quem se relaciona) se unem à Fraternidade - uma espécie de resistência contrária ao poder do Grande Irmão (afinal, onde houver um governo repressor, sempre haverá uma resistência) – com a intenção de lutar, mesmo sem saberem ao certo pelo quê.

    Mais do que uma ficção que relata a vida em um supercontinente sob um governo ditatorial, “1984” reflete sobre a influência dos meios de comunicação na sociedade, sobre o controle do pensamento e, principalmente, sobre o quanto a realidade é manipulável. Sobretudo, nos mostra o quanto é atual essa discussão iniciada nos primórdios do século XX. Alguns livros, após lidos, sempre modificam a forma com que seus leitores veem o mundo. E George Orwell, certamente, escreveu um destes.

2 comentários:

  1. haha. não li ainda, aliás, nem vou ler, por enquanto, pq vou fazer do mesmo livro, mas tive que rir do "aviso de spoiler" :D

    ResponderExcluir
  2. hehe olha a inspiração do Paulo.

    Ainda não consegui ler o 1984, mas coloquei como prioridade na lista. ;)

    ResponderExcluir

Jovem Foca