terça-feira, 21 de setembro de 2010

Papo de buteco - parte 1

Paulinho era daqueles garçons de bar de esquina. Aqueles com pano de prato no ombro, bloquinho de anotações engordurado e palito entre os dentes. Cada cliente que entrava ali já era um velho conhecido, mesmo que Paulinho nunca o tenha visto por aquelas bandas. Era o tipo carismático e risonho. Era comum ouvir dos clientes um tradicional "Paulinho! O de sempre, por favor.", seguido por uma piscadela malandra, aquela típica de freguês antigo. Na esquina da frente ficava uma redação de jornal, um prédio velho, mal pintado e com uma velha placa na frente, que lembrava os tempos áureos do periódico, que já não andava muito bem das pernas.

Cada fim de expediente do jornal significava junção de jornalistas no buteco. Era o momento do dia em que o editor parecia humano e aquele foca que quase estragou a matéria de capa deixava de ser um filho da puta. A nova estagiária não ia, infelizmente. Segundo fontes seguras (o faxineiro da garagem), ela foi vista saindo no carro do diretor do jornal. A galera do departamento comercial também comparecia, mas sentavam em mesas separadas. Eles tinham um certo receio em misturar-se aos jornalistas, coisas da profissão. Mesmo assim, o grupo da redação ocupava quatro mesas, umas 20 cadeiras e dobravam o trabalho dos atendentes. Mas o Paulinho era o único com quem os jornalistas realmente gostavam de conversar.

- Diz aí Paulinho, quem ganha o clássico hoje de noite?
- Ah, coringão vai fazer dois e dar um banho de bola.

Normalmente o garçom errava em seus palpites, mas sempre conversava com a turma da editoria de esportes como se fosse um grande entendedor do assunto. Além disso, apenas o Paulinho sabia qual a combinação de fritura com álcool mais agradava cada um deles. A galera da Geral aproveitava para ouvir as queixas do atendente, que sempre dava boas sugestões de pauta sobre ruas mal iluminadas e esburacadas. Os loucos da política e da economia, após discutirem sobre ideologias partidárias e sobre o futuro do país, perguntavam ao garçom sua opinião sobre as eleições.

- Já tem candidato Paulinho?
- Olha, ainda tô pensando. Mas acho que vou mesmo é votar em branco. Pelo menos, pelo meu voto é que esses ladrão não vão se eleger.

Sim, Paulinho é um crítico da sociedade e do sistema político brasileiro. E mais do que isso, é o principal pauteiro do jornal da outra esquina, mesmo sem saber ao certo pra quê serve um pauteiro. Após duas horas de bate-papo, os jornalistas começavam a debandar. Pautas anotadas, muita cerveja e gordura trans no organismo e sorrisos nos rostos. Pagavam as contas e iam embora. O bar ficava vazio, sem brilho ou vida. E o Paulinho, ainda com o palito entre os dentes apenas pensava com seus botões: "esse bando de jornalistas nunca me deu um centavo de gorjeta".

2 comentários:

  1. Essa relação de Jornalista com boteco é um conhecimento que tive recentemente, mas que agora pensando bem vejo que é bem verdade tudo isso mesmo!Muito bom Renan!

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